Por que o
Brasil precisa investir mais em Educação?
O país
tem uma dívida histórica com seu sistema educacional. Para saná-la, são
necessários muito dinheiro e boa gestão.
O projeto de lei que instaura o novo Plano
Nacional de Educação (PNE) deveria ter entrado em vigor no início de 2011. Mais
de dois anos depois, o texto ainda aguarda o fim da tramitação. Um dos
principais motivos do atraso é a polêmica em torno da meta número 20, que
define o valor a ser investido em Educação até o final dos dez anos de vigência
do PNE.
Três
correntes se enfrentam nessa discussão: além dos defensores do investimento
equivalente a 10% do Produto Interno Bruto (PIB) - proposta aprovada na Câmara
dos Deputados, em discussão no Senado até o fechamento desta edição -, há
aqueles que trabalham por um percentual menor, entre 7 e 8%, e uma terceira
vertente que afirma ser desnecessário ampliar o valor atual.
O
principal argumento desse último setor se apoia em uma conclusão equivocada,
obtida com base em dados verdadeiros. Atualmente, o Brasil e a Coréia do Sul
investem praticamente o mesmo percentual do PIB em Educação (4,97 e 4,63%,
respectivamente, segundo dados do IMD World
Competitiveness Yearbook 2012).
Apesar disso, o país asiático figura entre os mais bem colocados nos rankings
do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa), enquanto nós ocupamos
a amarga 53ª posição. Surge, então, a pergunta: se investimos o mesmo, por que
apresentamos resultados tão diferentes?
A melhor maneira de responder a essa questão é
desfazer uma confusão de conceitos econômicos presentes na comparação: Brasil e
Coreia não investem o mesmo. Utiliza-se o percentual do PIB como referência
para obter a dimensão do esforço que cada país faz para garantir um ensino de
qualidade.
Contudo,
essa informação não pode ser a base para contrapor diferentes países, pois
desconsidera particularidades importantes. Por exemplo: se dividirmos os PIBs
da Coreia do Sul e do Brasil pelo número de habitantes de cada país, o valor per capita obtido será de 32,4 mil dólares anuais para os coreanos e 12
mil para os brasileiros.
Com
base nessa idéia, o relatório Education at a
Glance, da Organização
para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), propõe uma análise mais
justa. Segundo o documento, o Brasil gasta, em média, 2.647 dólares por aluno
por ano (incluindo Educação Básica e Superior). Na Coréia do Sul, o valor é
mais de três vezes maior: 8.542 dólares (veja o
gráfico abaixo).
Investimento
por aluno
Recursos gastos
por ano com cada estudante da Educação Básica à Superior*
Fonte OCDE. * Em dólares PPP (poder de paridade
de compra), fator de conversão que leva em conta o poder de compra da moeda em
cada país e não apenas a taxa de câmbio entre as diferentes moedas.
A comparação entre Brasil e Coréia desconsidera
também as diferenças entre os sistemas de ensino dos dois países. Nós
precisamos arcar ainda com dívidas acumuladas durante mais de um século de
descaso com a Educação pública.
Essa
dívida se traduz no fato de que apenas 35,5% da população brasileira tem 11
anos ou mais de estudo - período equivalente ao Ensino Fundamental e ao Médio -
e que 16% dos jovens entre 15 e 17 anos não frequentam a escola, segundo a
Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2011. Isso sem contar o
enorme déficit no atendimento da Educação Infantil. Incluir todos no sistema
educacional demanda dinheiro. Construir escolas, instalar quadras, laboratórios
de informática e bibliotecas, ampliar o sistema de transporte escolar, aumentar
a grade docente são apenas alguns dos gastos que teremos nos próximos anos.
Apesar
das diferenças, é possível usar a Coréia do Sul como exemplo do que ainda é
preciso fazer. Na década de 1970, o país investiu pesado na instrução de seu
povo, o que possibilitou uma garantia de estabilidade para o desenvolvimento
econômico. O
livro South Korean
in the Fast Lane (Young-Iob Chung, 480 págs. Oxford University Press, oxfordscholarship.com, 20,93
dólares, sem tradução para o português) mostra que o país chegou a gastar, em
1973, 9% do seu PIB em Educação. Com os atrasos superados, a Educação
consolidada e uma economia forte, esse percentual pôde ser reduzido
gradativamente.
É
fácil entender o porquê disso. Construir infraestrutura e educar um batalhão de
jovens e adultos que não puderam frequentar escolas na idade correta são gastos
temporários, que diminuem com o passar dos anos. A população brasileira está
ficando mais velha e o número de crianças e jovens em idade escolar será menor
no futuro, permitindo que o investimento por aluno aumente. É o chamado bônus
demográfico.
Alguns
gastos, entretanto, precisam ser colocados no planejamento de longo prazo,
principalmente os relacionados ao pagamento dos professores. O Brasil tem de
abrir a carteira e garantir, além do cumprimento da Lei do Piso, planos de
carreira que incluam o aumento na remuneração média dos profissionais da
Educação. Também é necessário contratar mais docentes e criar programas
consistentes de formação continuada para quem já está na ativa.
O
Ensino Superior, que não é nada barato aos cofres públicos (cada aluno custa,
por ano, 11.740 dólares), é outro segmento que carece de investimentos em larga
escala. Além de facilitar o acesso a esse nível educacional e estabelecer
políticas que garantam a permanência dos estudantes na universidade, é urgente
a necessidade de expandir a rede pública sem permitir que haja queda na
qualidade. A mais positiva consequência dessas ações é a melhora na formação
inicial dos professores da Educação Básica.
Diante
desses fatos, fica claro que precisamos de um aumento expressivo na quantidade
de recursos destinados à Educação. Cabe ao governo colocar a área como
prioritária e estudar alternativas para ampliar o investimento, garantindo
mecanismos legais capazes de aumentar o percentual repassado às redes públicas,
sem onerar a população, em especial, os mais pobres.
Vale
lembrar, por fim, que o dinheiro por si só não é capaz de resolver de forma
mágica nenhum dos problemas de nosso ensino. Para que isso aconteça, é preciso
garantir a boa gestão do investimento. No mês em que se comemora o Dia da
Educação (28 de abril), é importante lembrar que pais, alunos, professores e o
poder público têm a obrigação de acompanhar a aplicação dos recursos e
fiscalizar as contas para garantir que o dinheiro vá para as áreas de maior
prioridade.